28.11.05

Mordo os teus lábios ...

"Mãe Natureza" de A. Brito em www.olhares.com

Mordo os teus lábios
e o mar vem manso
e tardio
Mordo a tua língua
e o desejo aproxima-se
lento e tardio
Mordo o recanto acolhedor
dos teus seios
e o mar vem morrer
no recanto
da tua púbis
a espraiar
Amor.

(Fernando Bouça)

26.11.05

Como açucena ...


Foto colhida em http://pro.corbis.com/

Como açucena, abre-se o teu rosto
por sobre a doce, tímida paisagem:
serena imagem
na manhã de Agosto.

Como magnólia, vertes o perfume
das tuas ancas sobre o pinheiral:
ávido lume
casto e sensual.

(Daniel Filipe)

22.11.05

Há dias e dias . . .

Foto colhida em http://pro.corbis.com/

Há dias em que sou monja
Há outros em que sou fêmea
E, embruxada, na fogueira
Do amor ponho mais lenha.

Nos dias em que sou monja
Ardo nos claustros da lua.
Nos dias em que sou fêmea
No sol arrefeço , pudica.

(Natália Correia)

20.11.05

Eu queria mais altas as estrelas ...

Foto colhida em www.acap-peru.org/

Eu queria mais altas as estrelas,
Mais largo o espaço, o sol mais criador,
Mais refulgente a lua, o mar maior,
Mais cavadas as ondas e mais belas;

Mais amplas, mais rasgadas as janelas
Das almas, mais rosais a abrir em flor,
Mais montanhas, mais asas de condor,
Mais sangue sobre a cruz das caravelas!

E abrir os braços e viver a vida,
- Quanto mais funda e lúgubre a descida
Mais alta é a ladeira que não cansa!

E, acabada a tarefa... em paz, contente,
Um dia adormecer, serenamente,
Como dorme no berço uma criança!

(Florbela Espanca)

18.11.05

Retrato


Tigre adormecido,
coração do dia.
Rosto semeado
de melancolia.

Noite transparente,
Primavera escura.
Sombra rodeada
de mar e brancura.

Tigre adomecido.
Coração do dia.
Puro e violento
incêndio de alegria.

(Eugénio de Andrade)

16.11.05

Semelhante à imóvel transparência ...


Foto colhida em http://pro.corbis.com/


Semelhante à imóvel
transparência
à inesgotável face
à pedra larga onde o olhar repousa

Água sombra e a figura
azul quase um jardim por sob a sombra
a iminência viva aérea
de uma palavra suspensa
na folhagem

Semelhante ao disperso ao ínfimo
chama-se agora aqui o sono da erva
a ligeireza livre
a nuvem sobre a página

in A Nuvem sobre a Página(1978)
(António Ramos Rosa)

13.11.05

Beijo os teus seios...

Foto colhida em http://pro.corbis.com/

Beijo os teus seios e a tarde comove-se
como se tocassem os sinos.
Levanto a tua cabeça entre os meus dedos e abro contra o dia os teus cabelos
e, logo, as aves do silêncio levantam voo e dançam loucas em volta dos teus olhos
e a tua boca aperta-se,
morde
a minha boca
enquanto as minhas mãos vão procurando nenhum deus à flor da tua pele
por esse caminho branco onde agonizam éguas
vestidas de primavera.

(Joaquim Pessoa)

9.11.05

Mar

Foto colhida em http://pro.corbis.com/

Mar, metade da minha alma é feita de maresia
Pois é pela mesma inquietação e nostalgia,
Que há no vasto clamor da maré cheia,
Que nunca nenhum bem me satisfez.
E é porque as tuas ondas desfeitas pela areia
Mais fortes se levantam outra vez,
Que após cada queda caminho para a vida,
Por uma nova ilusão entontecida.

E se vou dizendo aos astros o meu mal
É porque também tu revoltado e teatral
Fazes soar a tua dor pelas alturas.
E se antes de tudo odeio e fujo
O que é impuro, profano e sujo,
É só porque as tuas ondas são puras.

(Sophia de Mello Breyner Andresen)

5.11.05

O corpo


Porque em teu pénis pulsam os papiros
E de seda no sono és um vitelo,
Porque os anéis do plenilúnio adquire-os
A luz de que se ocupa o teu cabelo,

Porque ergues a cabeça e caem lírios,
porque abres a camisa e és muito belo,
Porque um gato de febre em teus delírios
Divaga meus quadris de terciopelo.

Porque eu saio da concha do vestido
E num palor de sol submetido
Declinas no meu fim inominável,

Porque nevo se estás no solstício,
És a paixão votada ao sacrifício
Que devo a uma estrela insaciável.

(Natália Correia)

3.11.05

Um amor como este ...

Um amor como este
não pede mar ou praia:
somente o vento leste
erguendo a tua saia.

O resto é o futuro
além, à nossa espreita:
doce fruto maduro
na hora da colheita.

(Daniel Filipe)

1.11.05

Alquimia


Abre a janela
Aquela, onde poisam os pardais
Procura a estrela que brilha mais
Coloca-a no teu peito
E aumenta-lhe o efeito
Com a ternura de um sorriso
Agora, apenas é preciso
Acrescentar uma pitada de poesia
Ou uma noite de amor…
Deixa aumentar o calor
(nada há que o evite)
Esquece a tristeza e verás
Que o céu é o limite
O paraíso és tu mesma quem o faz!

(Albino Santos)